(Foto: ALEGO )
Contemplando o Dezembro Vermelho, desde 1988, a Assembleia Geral da Organização Nações Unidas (ONU) e a Organização Mundial de Saúde (OMS) instituíram o primeiro dia do mês de dezembro como sendo o Dia Mundial de Luta contra a Aids. O Dezembro Vermelho, campanha instituída pela Lei nº 13.504 de 2017, marca uma grande mobilização nacional na luta contra o vírus HIV, a Aids e outras ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis), chamando a atenção para a prevenção, a assistência e a proteção dos direitos das pessoas infectadas.
Esse é um passo importante para que se consiga cumprir o audacioso compromisso, assinado na Declaração de Paris, com vistas a acabar com a transmissão da Aids enquanto ameaça à saúde até 2030. Ao trabalhar em conjunto, as cidades e estados signatários aceleram as ações locais para acabar com as epidemias de HIV, tuberculose e hepatites virais. A Declaração de Paris está vinculada às metas globais da UNAIDS, programa conjunto da ONU que coordena as ações a serem desenvolvidas em resposta às doenças.
Para tanto, as ações da Campanha do Dezembro Vermelho são uma grande janela de oportunidade, que tem o intuito de alertar a população sobre as formas de contágio e tratamento da Aids e de outras ISTs, além de marcar a luta contra o preconceito, a desinformação, o estigma em torno da doença, os direitos do seu portador, além de estabelecer maior conscientização. A data também tem o objetivo de estimular a participação dos profissionais e gestores de saúde procurando enfatizar a importância do diagnóstico e do tratamento adequado da doença.
Evolução
O mundo inteiro voltou os olhares para essa moléstia nos anos de 1981, quando foram registrados os primeiros casos nos Estados Unidos, no Haiti e na África Central, simultaneamente, tornando a síndrome da imunodeficiência adquirida(Aids) uma grande preocupação das autoridades em saúde pública. No entanto, a história mostra que o vírus da imunodeficiência humana (HIV) circula entre os seres humanos desde o final do século XIX.
Foi ao longo da década de 1980 que a Aids se espalhou rapidamente pelos cinco continentes, infectando 300 mil pessoas e provocando uma epidemia mundial. No início, a enfermidade era considerada uma sentença de morte e foi associada a apenas alguns grupos populacionais, o que gerou muito preconceito e perseguição. Apesar de ainda não ter cura, as descobertas científicas ao longo da história permitiram adotar estratégias mais eficazes para a prevenção da doença, como o uso de preservativos, e o tratamento de seus sintomas, possibilitando o controle e a convivência.
No Brasil, a confirmação do primeiro caso de Aids foi registrado na cidade de São Paulo, mais especificamente no Hospital Emílio Ribas, em 1980. Porém, foram necessários ainda mais dois anos para que o diagnóstico fosse classificado como Aids demonstrando a dificuldade inicial em lidar com a nova descoberta. Somente alguns anos mais tarde (1986), foi criado o Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da Saúde, o maior programa público do mundo no enfrentamento à Aids.
Dessa forma, o Brasil saiu à frente na América Latina, sendo o primeiro País do continente a isolar o HIV-1 graças ao trabalho de pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz. Além disso, o referido Programa Nacional de DST e Aids recebeu a premiação de 1 milhão de dólares da Fundação Bill & Melinda Gates por reconhecimento às ações de prevenção e assistência no País. Todos esses esforços foram responsáveis por uma grande revolução que fez surgir as mais modernas terapias, dentre elas a terapia antirretroviral que consiste no uso de um conjunto de medicações, capazes de promover um aumento na expectativa de vida e que ainda hoje prevalece.
Entretanto, na contramão do que é visto no resto do mundo, os casos de Aids no Brasil tiveram um aumento de 21% nos últimos 8 anos (dados de 2010 a 2018), colaborando para aumentar inclusive os números de casos na América Latina que registrou 35 mil mortes nesse período. Sem o Brasil, essa região teria registrado uma queda de 5% no número de novos casos (em números absolutos, o Brasil registrou 53 mil novos casos somente em 2018).
Ações
Na tentativa de amenizar essa situação, anualmente o Ministério da Saúde divulga um estudo com informações sobre os casos de HIV em gestantes/parturientes, puérperas e crianças expostas ao risco de transmissão vertical, de infecção pelo HIV e de aids em todos os 26 estados brasileiros. O Boletim Epidemiológico dispõe de dados básicos, indicadores e análises que podem contribuir para o controle do HIV e da Aids no país, no sentido de fornecer subsídios à tomada de decisões nos níveis federal, estadual e municipal.
Em Goiás, a Secretaria de Estado da Saúde (SES-GO) realizou no Palácio Pedro Ludovico Teixeira, a abertura oficial da campanha Dezembro Vermelho, no último dia 1º - Dia Mundial de Luta contra a Aids. Seguindo o calendário, a Assembleia Legislativa de Goiás, através da Diretoria de Saúde e Meio Ambiente do Trabalho, também promoveu, no último dia 5, a testagem rápida para aids, sífilis e hepatite B e C, com a distribuição de preservativos. Além dessa atividade, que busca promover a prevenção, o saguão principal da Casa e toda a sua fachada principal foi iluminada na cor que contempla esse mês.
Especificidades
De acordo com o médico infectologista do Hospital Estadual de Doenças Tropicais (HDT), unidade de referência no atendimento eletivo e de emergência de média e alta complexidade em infectologia, Taiguara Fraga Guimarães, a partir do momento que o indivíduo dá início à vida sexual, é necessário uma série de medidas e cuidados para afastar a possibilidade de contágio com qualquer DST, dentre elas a Aids.
Taiguara avalia que, para uma sociedade considerada cada vez mais liberal e desprovida de preconceitos, infelizmente abordar as questões que envolvem a sexualidade humana ainda é um grande tabu, especialmente quando envolvem as relações homossexuais. Entretanto, ele alerta para a necessidade desses grupos buscarem informação e conhecimento, pois estes, juntamente com os negros, pessoas de baixa renda, usuários de drogas, mulheres trans e travestis, compõem o grupo mais vulnerável e atingido pela doença.
“O aumento de novos casos no Brasil demonstra que, apesar de todos os avanços recentes no País na expansão do acesso às informações e no tratamento como parte de sua estratégia de prevenção combinada, o Brasil precisará ampliar ainda mais a resposta para ser capaz de reduzir a curva de novas infecções”, advertiu Taiguara.
Segundo ele, o vírus HIV pode ter um período de incubação bastante prolongado, sem ter um prazo determinado para se manifestar. Entretanto, mesmo durante essa fase, o portador pode contaminar outras pessoas. Quando o vírus desperta no organismo é que a doença conhecida como Aids se instala, sequestrando as células e destruindo os linfócitos T CD4+, aqueles responsáveis por uma via importante de defesa imunológica. É alterando o DNA dessa célula que o HIV faz cópias de si mesmo e se instala causando a Síndrome da Imunodeficiência Humana, tornando as pessoas infectadas mais suscetíveis e propensas às diversas infecções oportunistas.
“Tudo isso porque ter o HIV não significa ter Aids. Existem muitos soropositivos que vivem anos sem apresentar nenhum dos sintomas e sem desenvolver a doença. Mas podem transmitir o vírus a outras pessoas por meio das relações sexuais desprotegidas, pelo compartilhamento de seringas contaminadas ou de mãe para filho durante a gravidez e a amamentação, quando não tomam as devidas medidas de prevenção. Por isso, é sempre importante fazer o teste e se proteger em todas as situações”, explicou o médico.
O especialista alerta que o vírus pode ser transmitido através do esperma, da secreção vaginal, do sangue ou pelo leite materno. A infecção pode ser prevenida por meio do uso do preservativo nas relações sexuais, bem como por meio da PrEP (uma medicação antiviral que impede a infecção pelo vírus de forma profilática), ou ainda, por meio do PEP (uma profilaxia pós-exposição) que deve ser usada dentro de até 72 horas após o ato sexual. Todas essas medicações são disponibilizadas gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS).
“É preciso estar atento aos sintomas da doença avançada que são perda de peso, fraqueza, febre, infecções graves como pneumonias, diarreia, meningite, candidíase esofágica - infecções que não devem acontecer com frequência e com tamanha gravidade em indivíduos com imunidade normal. O impacto na saúde é grande para aqueles cuja doença evolui e precisam de internação prolongada”, observa o médico.
Acompanhando o progresso dessa doença crônica já algum tempo, o estudioso também explicou que ainda hoje não existe cura para a Aids, mas um tratamento eficaz através da adesão estrita aos regimes antirretrovirais (ARVs) que podem retardar significativamente o progresso da doença, bem como prevenir infecções secundárias e complicações. “De modo geral, o tratamento da infecção hoje é efetivo e relativamente simples. O maior desafio ainda é o estigma e preconceito que tornam as pessoas mais vulneráveis e causam o diagnóstico tardio da doença”, pontuou ele.